OUTRO OCEANO, OUTRA MONTANHA
Mais do que uma linha de horizonte, Mollica nos mostra a extensão do espaço plástico. E a busca de novos espaços plásticos sempre esteve presente na história da pintura. Exemplos: o espaço remoto em Van Eyck e a representação do espaço imediato em Leonardo da Vinci. No casal Arnolfini uma nova classe social ascendente e, na Mona Lisa, como essa classe social passou a ver o mundo. Chega-se a Cézanne que ao perceber o espaço plástico à frente do quadro o faz coincidir com este imediato no qual nos orientamos. Espaço este no qual Duchamp colocou A fonte. Abre-se o leque para vários contrastes com a introdução das dimensões temporais a partir dos cubistas.
Mollica ao nos mostrar a paisagem do Rio de Janeiro como se a contemplássemos do mar nos faz pensar como se a víssemos por uma primeira vez, no eterno presente, ou apenas como no seu aspecto figural, como se viesse do passado de nossa memória afetiva. Temos então as várias distâncias, nada quantitativas, mas qualitativas, ou como diz o poeta Michael Palmer, "as diversas distancias entre olho e pálpebra" e, por consequência, uma possibilidade de vários lugares. Uma grande sensação se instala predominante sem, entretanto, excluir as pequenas. Deslocamentos surgem e sentimos como se a paisagem girasse. Um estranho contraste, um estanho espaço plástico em nada cartesiano! Nele convivendo simultaneamente o permanente e o transitório. Acredito que Mollica com seu pensamento plástico no qual a simultaneidade de cores e formas são sua essência, está nos propondo, entre outras coisas, uma nova geometria. E para isso estudos constantes da tradição a pintura é fundamental.
O trabalho de Mollica assim nos mostra o quanto é importante para os artistas um saber do olho. Saber esse que está muito além dos simples aspectos ou racionalizações do objeto com suas especulações intangíveis segundo Cézanne, ou como diz Braque: "Explicar uma coisa é substituir a coisa pela explicação." Assim a experiência adquirida permite, espinosamente, uma intuição com conhecimento.
Esse saber do olho, que é muito mais que uma simples percepção do espaço plástico, vai permitir também uma posição crítica e um trabalho autoral. Por consequência, uma liberdade a partir da qual se entende, como diz o próprio Mollica, que o cidadão não deve ser substituído "pela condição de consumidor (e digo eu, também de agente) para o consumo desse espaço."
Portanto não concluamos. Basta perceber e sentir esses novos espaços que Mollica constrói.
José Maria Dias da Cruz